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terça-feira, 31 de maio de 2011

SONETO DA SAUDADE ESDRÚXULA =====

                                          Todas minhas recordações
                                          (Se bem que delas nada mais importe)
                                          Feitas de nostálgicas divagações

                                          Persistem contigo pela memória.
                                          Assim no tempo provoca este corte,
                                          Trazendo à tona nossa história.

                                          Tantas das minhas melhores lembranças,
                                          Que de repente o presente invade
                                          São elas duma tristonha saudade
                                          Já remida por amargas nuanças.

                                          Velhos retratos, instantes felizes...
                                          Só aparências que se desvanecem.
                                          Porém coisa alguma te diz, não ligues,
                                          Essas imagens que meus olhos ferem.


TELEMARKETING MACABRO =====


De repente toca o telefone... Era uma dessas operadoras de telemarketing.
- Boa tarde, Sr... Tudo bem? Eu gostaria de falar com o Sr. Marcos Roberto Nunes Santana.
- É ele.
- Nossa conversa, Sr. Marcos, está sendo gravada para sua maior segurança...
Daí pôs-se a oferecer-lhe um seguro de vida, com mil vantagens.
- Então, Sr. Marcos... O Sr. tem filhos? - Fazia uso a moça de artifícios psicológicos a fim de convencê-lo aceitar o plano da Financeira. E lá ia ele respondendo aquele enfandonho questionário sobre estado civil, idade, casa própria, renda etc.
- A família é sagrada né, Seo Marcos... Deus os livre de um sinistro. - A atendente parecia aterrorizar-lhe.
- "Deus os livre, um cacete!" - Respostou ele, nada convencido. - Como a própria palavra diz, de forma inesperada. Acidente é um acidente por descuido humano, mecânico ou provocado pela natureza. E se Deus não nos livra é porque estava cochilando, como faz todos os dias por aí.
Ela fez que não entendeu, fingindo uma súbita interferência na ligação.
- Desculpe, nossa falha.
- Viu, acontece... - Agora certamente a moça se despediria.
- Nós, Sr. Marcos, também estamos oferecendo, isento de anuidade, cartão de crédito para o senhor e um cartão adicional para sua espôsa...
Bastou mencionar a conjugue para que o camarada ficasse alterado. O casamento perigava e sua fidelidade era só uma questão de oportunidade.
- Escuta aqui, eu tô querendo separar da minha mulher e você quer me ligar à ela num cartão de crédito adicional!...
Nem disse "passar bem", desligou o telefone.

terça-feira, 24 de maio de 2011

CRÔNICA VIRTUDE =========

                             Louco, por que te fere
                             A morte do cão na calçada?
                             Que lhe faz impiedosamente
                             Lembrar à vizinha
                             Coração sem gente dessa!
                             Os quartos do cachorro
                             Nas rodas do carro
                             Esmagado.
                             Ela está aliviada, graças a Deus...
                             Pois Bilu
                             Vive na coleira amarrado.

                             Ambos naquela agonia serena
                             Virtude estúpida
                             De defensor,
                             Em sofrer calado.
                             Doido
                             O que mais pode te machucar?
                             O modo desta abolição aceita
                             Com ressalvas,
                             Os riscos ao se andar na pista.
                             Ou o transtorno que te causa
                             A insanidade da existência ser
                             Por demais simples e cruel.


CAXIAS ==================

Caxias por imposição da mãe foi prestar serviço militar num Forte do Exército. Tentou fugir jamais quis se alistar. Não porque não quisesse lutar, o que renegava era aquela farda.
- Não quero bater continência, mãe... Me rebaixar pra outro igual.
- A pátria te chama, meu filho. - Dizia a mãe gentil.
Seu aspecto demente fazia dele vítima constante da sandice de Tenentes e Cabos. Nas simulações de combate, enlameado, cheirando à urina e massacrado por uma torrente de socos e pontapés deixava-se delirar ruminante...
"De que serve a infantaria senão, dar vazão aos instintos assassinos e inúteis aspirações heróicas. Tornar o outro na trincheira oposta nada mais que a encarnação do mal. Nos fazer odioso juiz, réu confesso e testemunha impotente da nossa miserável condição humana..." - Tudo fruto de suas leituras e conversas com os amigos nas farras noturnas. - "Se digo isto, sou tomado por idiota. Que o recruta não deve se ater as idéias, mas ao alvo. Como se tivéssemos nascido para matar, ou morrer enganados".
- As "moças" pensam que uma guerra é brincadeira de bandido e mocinho? Que estão aqui para serem soldadinhos de chumbo!... Não finja ser um soldado. Seja um! - Lembrava o Coronel com rigor sádico.
De sentinela numa madrugada Caxias dormiu sentado, o dedo preso ao gatilho do fuzil. Um outro soldado de campana logo acima fumava seus cigarros. Teve um pesadelo medonho, forças inimigas acossavam seu pelotão... No auge da perturbação do sono, Caxias premiu o gatilho atingindo o companheiro no rosto.


quarta-feira, 11 de maio de 2011

SEPARAÇÃO DE BENS =======


                      - Isto é meu...
                                    Aquilo também
                                    me pertence. - Larápio egoísmo.
                                             
                                    O que tinhas de mim
                                    deixa...
                                    O estrago.

                                    De resto nada mais queres levar,
                                    coisas sem importância...
                                              
                                    Só o meu bem
                                    não é teu.
                                        

ECOS URBANOS ============


Então depois de muito matutar, veio-lhe o surto da bendita inspiração. Frases inteiras. Outro parágrafo. A estória propriamente dita... Cofiava os cabelos desgrenhados. A cada idéia que acudia seus pensamentos quedava-se silente, naquela batalha interior sem testemunhas... A quem aquilo teria relevância? A que coração falaria?
Rabiscou sobre a torta caligrafia. Escrever sem pretensões repetindo Kafka?... Quanta pretensão! Tampouco palavras sem ouvidos têm voz. Atrever-se a transformar o mundo, este paradigma de T. S. Eliot e tanto mais...
Olhava em torno avaliando a inutilidade das coisas abjetas. Nas paredes as contas no prego, uma foto feliz do amor sob concordata, os dias idos do calendário. Sua coleção de discos, a confusão de livros e papéis amontoados pela escrivaninha. A existência tranquila em lugarejos bucólicos no caderno de turismo do jornal... Por fim emaranhou o papel numa bola disforme.
Vagava pelos cômodos abraçado à garrafa, salva-vidas daquele naufrágio pessoal. Nenhuma preocupação para consigo. O cheiro acre tornava a natureza agradável, permitindo longas divagações a respeito da êfemera biologia das moscas... Seu corpo vestia personagens dos quais ele pretendia se despir. Para que fossem viver nos leitores suas ángustias, vitórias, um drama sublime. Era todo alimento que saciava seu espírito. Mas, que o estômago rechaçava veemente...
Através do vitrô do banheiro advêm os ecos urbanos nas primeiras horas. Despertou com a réstia do sol contra o rosto curando-o da embriaguez. Entre uma diarréia e o vômito enchia páginas de intensa Literatura.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

ACTA MENOS ARDIDA =======







Absolutamente,
Nada é justo.
Quem pode sê-lo?
Com justiça...
Nem a tua velha
Inapelável calça jeans.
Do que me adianta
Vestir-se de gostosa,
Despida pelos outros.

MORAL DA HISTÓRIA =======

Chegou ainda pintinho na casa do macetoso Mangaba. Um mimo para a filha. garota sapeca, dessas que esquartejam boneca com precisão cirúrgica. A intenção era domar os ânimos da menina. Pois bem, a tal psicologia surtiu efeito. A moleca serenou.
Galindo, como chamaram-no, transpôs incólume os afagos calientes da pequena. Logo emplumou-se de um branco angelical. Sua crista pendeu de lado num topete a "la Elvis Presley". Mal o relógio badalava 04:00h da matina, o galináceo fazia seu concerto matutino.
Não tardou os vizinhos do cortiço quererem depenar Mangaba e o frango. E na tentativa de calar a ária do galo, que o tonto irrácivel aviu-lhe uma concubina. Garnisé jeitosa, por demais faceira.
Converteu a diminuta área de serviço num moderno flat empoleirado. Durante algumas semanas o danado fechara o bico. Mas, bastou a garnisé pôr ovos e os chocar para que Galindo solta-se o gogó. Exibindo seu orgulho de pai, numa demonstração de maestria aos filhotes.
Galindo vivia a existência que pedira a madrasta natureza. Embora Mangaba andasse de saco cheio, olheiras profundas... De fazer pena! Disposto a tapear a pirralha deu-lhe um vídeo-game. E sumiu com os galináceos, vendendo-os a um sitiante...
Esse lugar não era melhor. Entretanto, espaçoso e havia muitas galinhas. Todas dando a maior sopa (quer dizer, canja!). A família desfeita bastava levar as penosas no bico. Os acordes da cantada ecoaram pela paisagem bucólica... Nisso apareceu um carijó garboso fugido do galinheiro a esgaravatar em redor de Galindo. Cacarejaram diplomaticamente sem consenso. Teve início o round. Galindo fez uso de sua arte marcial instintiva, mesmo assim eram parcos golpes frente à espora castiça do carijó. Tombou pernas pro ar, convulsionando até o derradeiro golfejo.
Não torrara na chocadeira. Resistiu aos carinhos da filha do dono inconsequente, e sua prole deixava como herança a civilização. Sucumbia às leis da natureza.