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sexta-feira, 26 de agosto de 2011

NOTÍCIA PARA MANUEL BANDEIRA =====

                          
                       De madrugada
                       Mata a mulher,
                       Os filhos
                       E dá cabo de si mesmo.

                       Corre a vizinhança
                       Antecipa o sol
                       Trazendo a réstia das velas,
                       Pasma em espanto...

                       - Que Deus os acolha num bom lugar.
                       - Vá o maldito pro inferno!

                       Anjo bêbado sem juízo, sem salário
                       Agradou a Deus, não menos ao Diabo.


A ESPERA NO SENHOR =======

Uma vida de agruras aquela, a saúde lastimável. Mas ele tinha fé num deus todo-poderoso, fiador de sua alma, que nunca lhe abandonara. A gente mundana e seus pecados a atrair calamidades, infortúnios, a fazer prevalecer o inimigo. Em meio a multidão de pecadores pretendia-se distinto.
Todos os dias ele ajoelhava-se e suplicava ao Senhor uma graça qualquer. A realização de seus mesquinhos desejos, amenização de suas dores, salvaguardá-lo das desgraças. Pedia fervorosamente ao céus que os negócios não fossem mau, nem caísse o faturamento, pois o dinheiro é o preço da vida, e não vivesse ao "deus dará".
Com isso acreditava arrancar de suas bençãos as dádivas de alguns trocados para o feijão e a tira de carne de um boi condenado... Quando não jejua compulsoriamente, cumprindo as regras de determinado ritual. Haveria de prosperar na fé, Deus ensinara-lhe como administrar sua vida. Pelo seu sacrifício queria receber para estar à altura das grandezas do Pai Celestial.
Adulava Deus se fazendo obediente na presença do Senhor. E do Pai seria devedor caso não difundisse o Evangelho. Poderia padecer pior, não fosse a consideração que a divindade dedicava ao servo fiel. Mesmo quando uma fatalidade decepara parte de sua perna, Deus poupou o resto para que desse testemunho da divina misericórdia.
A ele é dado suportar todas as necessidades, na crença de que no fim tudo sairá bem.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

DRAMÁTICO ===============

Encontraram-se uma única vez,
Com a sensação de que fosse a última...
Porém ambos se completam,
Há de ser pra todo sempre.
Farão deste acaso, destino.

                    Trocam ingênuas confissões,
                    Descobrem mútuas afinidades.
                    Selam longos beijos...

Se não der certo!?
Haverão de morrer...
Já querem sofrer
Pelo alívio da reconciliação... Se houver.
Que não seja ela,
Nem ele!
A cometer semelhante crueldade.
Outro alguém
Com igual gosto
E desejo, nunca!


Ainda assim, eles só querem
Ser um do outro,
Correr o risco. 
Literalmente,
Quando isso terminar
É que se darão conta do drama.

PAPAGAIO EXPIATÓRIO =====

O papagaio era tão tagarela que por vezes parecia conversar, punha a língua no mundo e soltava o verbo. Sem essa de curupaco. Quem não o visse além do muro no poleiro, achava tratar-se de voz humana.
- Graá... Ei, tô vendo! Tô vendo!
Sob os cuidados da Dona não faltava-lhe sementes de girassol e uma boa rodada pela manhã de piadas de parentes seus, enquanto ela lavava a louça do café.
- O fulano bebeu tanto que tava chamando urubu de meu louro... - Ah, sim... Tinha daquelas de inconfessáveis palavrórios e também onde o papagaio "se fu".
Um dos maiores prodígios, condicionado pelo Dono era catar sementes com uma colherinha.
Vivia o casal uma fase difícil brigava-se por nada, ofensas trocadas eram o mesmo que elogios... O marido então ao chegar do trabalho passou a perceber que o louro trocava seu nome ao vê-lo, não sei se de propósito.
- Graá... Graá! Oh, Nelso!... Nelso! - Entre roufenho e estridente... Aquele psitacídeo só podia estar de sacanagem! Ficou ali na dúvida, desconfiado se periquito fazia e papagaio levava fama.
Meses depois quando o homem resolveu dar um basta, para a audiência litigiosa de separação de bens o Juiz convocou a ave como testemunha de acusação.
P...da vida a Mulher resolveu calar o bicho e tentou fazer dele um galeto. Receoso de perder a prova viva da desonestidade matrimonial, o marido acionou o Serviço de Proteção à Testemunha. Vive ele agora numa gaiola, disfarçado de cacatua, escondido por aí.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

CARDO ===================


                              E foi que cai dos céus me espatifei
                              em sementes de angústia,
                              joio semeado no asfalto -
                              rebento duma placenta ulcerada,
                              meu vagido quando nasci
                              ecoou num grito desespero
                              e no colo magro tive inquieto sossego.

                              Seria nas sarjetas enlameadas berço,
                              depois meu recreio.
                              Muita tentação das vitrines,
                              muito cigarro pelo ministério proibido.
                              Muito fazer na oficina do diabo aqui embaixo.

                              Se a mim não deram escolha:
                              - Vai cumpre teu fatídico carma!
                              Onisciência de uma lógica insana.
                              Tenho assim escolhido segundo minha vontade.

LÉ MIU PAI... TATI ======

Brincava com o filho rolando no colchão, dando-lhe apertões enquanto a criança ria.
- Ahá!...
- Pai, mil colação!... - Indicava aflita pondo as mãos sobre o ventre.
- Não, meu filho, aí é a barriga. - Colocou em seguida a mão dele junto ao peito, onde batia aquele coraçãozinho agitado.
- Ah... Lé ati.
- Tá sentindo?... Tum-tum, tum-tum!
- É o papai!! - Sorria o garoto a repetir o tamborilar contra a palma da mão, percebendo o jogo.
- É, filho... O papai botou o brinquedinho pra funcionar aí dentro.
- Lé miu pai... Tati.
Ele estancou comovido.