# BLOG LITERÁRIO # POEMAS - CONTOS - CRÔNICAS #

sábado, 26 de novembro de 2011

MÁCULA ==================


                                   Havia algo de bom em mim
                                   Pelo que te enamorastes,
                                   Cujo sentido se desencantou...
                                   Para quê atravessastes meu destino,
                                   Se nos tornamos estranhos
                                   Um ao outro?
                                   Cada qual num seu caminho.
                                   Como te sentistes maculada
                                   E repeles esta afeição
                                   Esteja certa,
                                   As marcas do teu amor
                                   Indeléveis neste coração
                                   São minhas feridas.



CONSCIÊNCIA DE CLASSE =====

"...Empresa multinacional exemplar, tudo fachada!!... Tratamento de primeiro mundo só para os seus!..." - Há dias ele vinha com aquilo na cachola. Nem acreditava que o médico da Firma alegara que suas dores nas costas não eram provenientes do trabalho exercido ali. Mas sim de funções anteriores num outro momento de sua vida, pois nada fora detectado pelos exames.
- Uma das funções exercidas pelo Sr. foi pedreiro, não é? O amigo precisa melhorar sua postura... Tome estes comprimidos. É um relaxante muscular... E vamos acompanhar a evolução do quadro.
Não podia aceitar de modo algum aquele laudo. Mesmo assim, continuou firme na descarga de açúcar do Porto. Em cada tonelada suada agregava valor ao produto com rancorosas cusparadas e doses etílicas de urina.
Na saída do seu horário noturno, como de costume logo pela manhã, enchia a cara. Era uma espécie de analgésico para o seu espírito arredio. Sem desconfiar vivia o desespero latente do qual nos constata Kierkegaard.
Falavam tanto em excelência, plano de metas e um blábláblá patronal sobre produção eficiente.
- Não queremos funcionários acomodados... Negativos! Que não tenham foco no trabalho, não dispostos a dar o máximo de si. Que ficam pelos cantos do Terminal se queixando para desvirtuar os bons. Esses aí, não se preocupam com a família de vocês... Ao invés de pedir, conquiste! Antes de exigir da Empresa, se pergunte o quê  você tem feito por ela. - Tentava impingir o Chefe, a Política da Firma na palestra motivacional. Claro que ele, não entraria no mérito do reajuste salarial tão defasado. Ou o horário da escala de trabalho cheio de truques, que roubavam horas extras aos operários, o desgaste físico provocado pelas atividades insalubres. - Pensem que vocês têm salário em dia... Pior é estar desempregado! E pra manter é necessário atingir os objetivos... - Quem diria que por trás daquele sorriso largo, as atitudes cheias de camaradagem, havia um carrasco. Se a Alta-Chefia dava-lhe um arrocho, ferrado apertava os de embaixo. Como o tal sempre desculpava-se, "os homens lá de cima mandaram".
Certamente naquela manhã encontrou um recadinho no banheiro privativo, escrito com pincel atômico em linhas tortas:
"Cagando, né?
 Agora tu não é malandro,
 nem chefe. É um bundão
 com as calças arriadas fazendo força,
 igual todo mundo." - Ele ria ao imaginar a reação do Chefe ante a verdade simples na porta do banheiro.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

URGENTE =================


Caiu um avião,
O expresso descarrilou...
Naufragaram todos.
É a bomba! -
Cérebros vão pelos ares.
Hoje à noite
No horário nobre
As estrelas
São os mortos.


O GLAMOUR DE CÉLIA ======

Célia quando jovenzinha possuía núbeis peitinhos empinados, insinuantes quadris, a pele aveludada num corpo sinuoso. Naturalmente uma preciosidade feminina, de fazer despertar o sentimento pedófilo na mais puritana das mentes masculinas.
Até quis ser dançarina de programa de auditório, sonhava com os astros da televisão colados nas paredes do seu quarto...
"Você jogou fora
 o amor que eu te dei,
 o sonho que sonhei..." - Tocava o aparelho de som a fazer duo com ela.
Nos concursos da cidade, no palco da pracinha todos os olhos voltavam-se para tão invejáveis atributos feminis. Ao que a danadinha requebrava com maior volúpia na intenção de ser descoberta por um desses empresários artísticos. Ela capaz nem desconfiasse que seria o motivo secreto de rios de esperma ejaculados por jovens e velhos. Mas aquilo de glamour não era para ela, num revés do destino escapou-lhe...
O tempo passou, Célia vive na sua cidadezinha. Casou e foi abandonada com três filhos pelo marido... A primeira vez aconteceu na festa de 15 anos, o fálico presente dele tornou-se futuro no inchar daquele ventre delicado.
Aos domingos ia a casa da mãe. Lá sempre tinha almoço farto e algum falatório, evidente. Apesar dos reiterados conselhos, contradizia com insensatas certezas e mostrava-se dona de uma sorte ingrata. Estranhamente se sentia no alto duma montanha, sem caminhos novos por onde seguir e lá embaixo a vida sem novidades.
Célia passa pela rua a arrastar os filhos. Hoje só não causa indiferença pelo mal jeito cômico com que trata as crias. Nem o padrasto "seca-lhe" mais à procura das formas nubentes. Está acima do peso e já nem sonhava mais, vive cheia de pesadelos.