# BLOG LITERÁRIO # POEMAS - CONTOS - CRÔNICAS #

sábado, 22 de outubro de 2011

TORMENTA ================

Uma ilha aquele apartamento, varrido
por repentino mau tempo...
- Estou indo embora... Pra nunca mais.
No horizonte da vidraça brusca
intempérie... Inunda-lhe uma lágrima.
- Sem você não consigo viver... - Murmura
dolente, quase inaudível. Agitada a
samambaia sacode com o vento da fresta.
- Como foi mesmo que nós chegamos
a esta situação difícil?... - Fere o
hiato lascinante relâmpago. A pergunta
os atormenta... Serve-se o veneno da
angústia, daquilo que consideram remédio.
- O que foi que não te dei...?
- Não queria que fosse assim... - Os lábios
de mornos beijos só fazem ofendê-los,
produzir o mal. Depois da perda de nada
adianta lamentar tantos sacrifícios, pois
o fato está consumado. Para o fim
do romance se encaminha... Antes de ir
no limiar da hora inadiável,
o balsâmo da despedida...
- Não sofras tanto. Sejamos bons amigos.
Convulsos soluços... Abandono.

MEU VIZINHO PLANTOU... =====


E foi que um dia resolveu, dadas as dificuldades de fornecimento pelo tráfico, plantar umas sementes de cannabis ativa no quintal. Logo a logística do cultivo estabeleceu-se em seus neurônios escassos. Pretendia criar uma espécie de estoque regulador. Estaria precavido da entre-safra do comoditie e circunstanciais dificuldades financeiras... Abastecer a comunidade da "Babilônia suspensa"! - Queimava a mufa a matutar. O vulto do negócio assustava-lhe e considerou melhor fumar a planta das folhas à raiz.
Baseou-se em manuais de agricultura, matérias de várias revistas. Lera farta literatura, se considerava um expert no assunto, aliado aos anos todos de consumo - Será que já fumara um alqueire?
Depois de cuidadoso cultivo vicejaram escondidos no canteiro uns folhudos pés de marijuana. Planejava talvez fazer um bolo nutritivo. As informações extra-científicas colhidas davam parecer de que a "viagem" era garantida, ou um outro produto feito a partir de tão versátil vegetal.
Num sábado desses de folga aparece em casa o sogro, e repara no jardim um pé daqueles. Ele temeu que o velho reconhecesse a erva. Qual desculpa daria? Nascera por acaso ali, tanto tempo que não mexia com plantas...
- Que mato é esse aí!?
- ...! - De repente esquecera as palavras.
- Será um pé de Mastruz? Tá diferente... Grande! - E pôs-se a esfregar as folhas e cheirá-las.
- Coisa do adubo orgânico... Titica de galinha, merda de cavalo...
- Isso é mastruz!? - Inquiria o sogro tentando esclarecer sua ignorância botânica.
- É de outra qualidade.
- Não conhecia...
- Mastruz de índio.
- Anh!...

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

NADSAT ==================

Em berço esplêndido
és mãe gentil,
mas relega teus filhos
à Pátria madrasta.
Garotos malvados,
vão quebrar vidraças
fazer molecagens
trepar por aí.
Cometer inconsequentes enganos
mostrar a língua qual sabem falar,
puro desacato desafeto.
Levando tanta porrada
já não sentirão dor...
São aberrações das tuas entranhas.



Mas descansem em paz,
Sossseguem vossa integridade
De adultos exemplares:
Responsabilidade de pai,
Inocência de mãe.
Envelhecer não requer idade...





Eis teu pródigo legítimo herdeiro -
Perdeu a graça o brinquedo sério.
Necessário é ser moço convicto,
Tomar na foto seu lugar devido
E abrir um largo sorriso.
Logo estará ele num Caminho Suave,
Viciado nesta sua droga de vida
Vai morrer de overdose.

CIDA ERA O NOME DELA =====

Numa cidade esquecida nos rincões deste país, uma mulher que enviuvara recentemente estava prestes a dar à luz. Embora, o fato de tornar-se mãe não a transformou como deveria.
Tempos depois que as gêmeas nasceram a mãe destas muito cansada dos afazeres resolveu adotar uma menina de rua como afilhada para ajudá-la nos serviços da casa. Cida era o nome dela.
Isso no começo, porque depois passou a obrigá-la fazer todas as tarefas sozinha. E quando Cida quebrava alguma xícara, ou não limpava o chão direito sofria os mais odiosos maltratos. Entre eles: apagar cigarros em sua pele, amarrá-la nua num quarto escuro.
As obrigações eram tantas que ela mal tinha tempo para se cuidar, por isso vivia de roupas puídas, os cabelos desgrenhados e não ia à escola como as "irmãs". Tinha os dedos furados pela agulha de tanto remendar as calças das gêmeas, as quais não davam a mínima pra ela.
Cida apesar dos pesares possuía um coração de ouro. Enquanto a megera perseguia os gatos que rondavam o muro, ela os alimentava às escondidas. Durante a dura faina cantarolava os sucessos das paradas pra espantar o cansaço.
Certa manhã em que mãe e filhas tomavam café souberam pelo rádio da realização do 'Grande Baile Anual de Máscaras', prestigiado pelas famílias bem sucedidas da sociedade. Um alvoroço irritante se instalou entre as gêmeas naquela semana. No seu íntimo Cida gostaria de participar, mas manteve-se quieta. A verdade é que ficou tentada, afinal não se divertia nunca.
Enfim chegou o dia tão esperado. Pela tarde as irmãs se preparam e fazem planos para a noite festiva. Tendo trabalhado a madrugada daquele dia em silêncio, Cida dava os últimos retoques na limpeza. Ao perceber as intenções da moça, a viúva tratou de impedir a filha adotiva:
- Cidaaa! - Esbravejou para em seguida indicar maquiavélica. - Faça-me o favor e dê brilho na minha baixela de prata, senão...
Desapontada a jovem deixou escapar baixinho um palavrão daqueles e às pressas lustrou toda peça de jantar com seu cuspo raivoso.
Escondida ela se aprontou para o baile. Ajeitou-se num velho vestido que guardara, penteou as longas tranças. Mas de tão exausta e hipnotizada pela sua imagem no espelho, adormeceu. Não faria mal algum cochilar até a hora de tomar o ônibus para a festa. Ficaria mais disposta...
O Casarão Municipal era deslumbrante e estava lindamente iluminado, fazendo reluzir as bijouterias nos pescoços das senhoras. Os pares pareciam flutuar enquanto dançavam, deslizantes pelos desenhos no mármore do piso.
Ágeis garçons equilibravam, entre os casais, bandejas de bengalinhas açucaradas, amontoados de croquetes, filas de gordos brigadeiros e taças de borbulhantes refrigerantes. Um lindo rapaz ofereceu-lhe sortidas maçanetas carameladas deliciosas. E sorria! Adorava... Maçanetas Carameladas!?
De repente despertou com o baque da porta... Dormira agarrada ao pé de sapato. Olhou o relógio, os ponteiros passavam um pouquinho da meia-noite. A família retornava da festa com grande alarido. As gêmeas suspirantes pelos rapazes, a viúva exausta de tanto dançar.