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sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

TRÁGICO FRACASSO ========


Veja o que faz de mim...
Triste
Abjeto
Culpado
Mórbido
Rancoroso
Ridículo
Sinistro
Fútil
Moribundo
Vivente do próprio inferno
Degredado do paraíso que te fiz.



CHIFRE NA PRÓPRIA CARNE =====



A consciência dele pesava tanto que resolveu desabafar:
- Minha mulher me traiu... Sou corno! Galhudo!! - Com isso aliviava a dor pungente.
- Com outro? - Perguntei. Ao que assentiu com pesar a cabeça. - ...Menos pior. - Manteve-se cabisbaixo, talvez temesse as repetidas vezes, "onde passa boi, passa boiada..."
Ele que ostentava pose de machão, agora choraminga ferido. Pois se considerava uma espécie de "macho-alfa", porém mansamente dominado pela fêmea-alfa de quem se tornara um bezerrinho.
Tamanha preocupação era inútil. O boi-alfa também é corno, não está nem aí e morre de amores pela vaca... E sequer está em extinção, ou inexiste como o Unicórnio.
- Isso acontece... Agora pode dormir folgado na cama. - Tentei remediar sem muita habilidade no assunto. Com quais palavras consolar sem parecer dizer, "não pense tanto porque você pode ficar careca de saber."
Confissões assim são duma constrangedora intimidade. Não que eu só seja solidário nas mórbidas tragédias cotidianas! Nem sou do tipo que vê na tragédia dos outros a nossa consolação. Tanto mais tratando-se dele, já havia adulterado o sétimo mandamento não sei quantas vezes. Nunca sentira o chifre na própria carne... Claro, guardei discreto segredo.
  

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

MÁXIMA POÉTICA ==========









Haver
Ou ter?
Porquanto
Haverá
Terás
A pedra
No
Caminho.




ATRÁS DAS GRADES ========

O que aquele detento contava decerto inspirasse desconfiança. Assunto retomado nas suas visitas naqueles dias à enfermaria. Numa espécie de testemunho desculpável da sua condição.
Corpulento, marcado de cicatrizes, tinha por volta de 37 anos... Falou um tanto da infância roubada.
- Lá no barraco faltava de tudo. Cama, feijão, pai... Minha coroa dava um trampo danado. Mas, dinheiro de pobre não rende. Caí pra rua. Sem ninguém por nós, a falta de freio... Já viu, né! A cadeia foi meu berçário, minha escola, e de alguns irmãos... Sério! - Assim ouvia-o ao sabor da consulta. O resolver por si mesmo, com a cara e a coragem pra vencer na vida, conforme ele mesmo disse.
- A pior privação é a fome... Eu comi o pão que o diabo amassou, que é a hóstia dos desesperados. Deus escrevia em linhas tortas pelos becos da favela pra gente endireitar... Aí, os caminhos se fecharam. - Alegou como um trágico destino do qual não pudesse escapar. - Quem nada tem, não tem nada a perder. Me meti em assaltos... Troquei tiros. Dei um bocado de trabalho!... A gente não percebe o momento que a coisa descamba.
Enquanto ele mencionava parte das desventuras da infância, eu me perguntei onde se perdeu aquela criança que chorava implorando pelo colo da mãe. O riso puro da inocência encoberta pelas maldades. Era a necessidade que o desvirtuava de anjo à categoria de demônio.
- ...Acho que passei mais tempo trancado do que solto. Queria dar a grande cartada pra me arrumar. Só causas perdidas... Eu seguia nessa contradição. Hora deus me abandonava quando perdia, estava comigo se vencia no crime. Salário de ladrão é o roubo. Poucos largam essa vida, parece maldição... - Dizia como a espera de um veredito favorável possivelmente, a motivar seu ímpeto de recuperação penal.
Embora, vez ou outra, meus contundentes questionamentos reforçassem a culpa, suas justificativas tinham o apelo dos arrependidos.
- ...Cadeia nunca foi hotel, mas sobra tempo pra matutar... Pro bem ou mal. Isso deixa um homem louco. É pendurado nas janelas do presídio que eu vejo a vida lá fora. Aqui nos isolam pelo que tanto temem, a solidão. E nos encarceram em meio ao tormento... Santo de tudo não fui! Se sou bandido, também o mundo me fez assim. Não foi a placenta da minha mãe e o pênis do meu pai. - Isto numa revolta contida, e depois silenciou ensimesmado.
Vindo dele quanto poderíamos confiar? Vê-lo com outros olhos e oferecer-lhe a benevolência do perdão... Mostrou-se satisfeito quando informei estar curado da virose.
- Sei o que pensam de nós... Para alguns, eu nem mereço esse remédio... Bastava apodrecer. - Provavelmente repetia sempre convicto seu álibi desacreditado. Afinal das contas o que valia era a pancada seca do martelo do juiz, o ranger do ferrolho da cela... A justiça feita.
   

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

POEMA CRUEL ==============



        Vou...
        Não é justo
        me prenderes
        ao teu querer.
        Queres me amar
        de um modo
        que não quero sê-lo.

        Foste sequer
        razão do meu viver,
        incapaz de encantar-me.
        Posso passar
        sem você,
        não temo
        ficar só.



SOUVENIR ================

São 5 horas da tarde. Chove um pouco agora... Não tem feito sol ultimamente. O carteiro não entregou nada aqui hoje, nem mesmo telefonemas temos recebido. Esses latidos frenéticos que você tá ouvindo, é o cachorro do vizinho em frente. Estão voltando às pressas do passeio... Ele não é de se meter na vida alheia.
Por trás destas portas, entre quatro paredes, quem suspeitará do inevitável destino que nos une?... Você há de considerar meu desespero. Me perdoe a extravagância. Só quis perpetuar nosso relacionamento.
Não lhe dizia, a taxidermia consegue milagres... Realismo fabuloso! Vi uma onça empalhada num museu, ela parecia rugir... Você está com uma ótima aparência. Posso sentir pelo toque.
...Deu trabalho despistar a polícia, afastar os parentes preocupados. Dizem que depois do seu repentino sumiço, eu me isolei ferido de amor... Embora você parecesse cada vez mais distante, eu quero tê-la perto de mim.
Vilda, minha terna Vilda... Meu tesouro raro! Troféu da minha conquista. Você foi feita pra mim, querida. E por todo sacrifício posso apenas compensá-la com um presente especial... Não é maravilhoso este anel de noivado? Gosta?... Deixe-me colocá-lo no seu dedo... Perfeito!!
...Tudo que sempre desejei foi dividir meus momentos contigo, participar da sua vida. Jamais suportaria ficar sem você. Eu lhe dei o melhor de mim, Vilda. Ninguém há de lhe amar como eu amo...
Acredite, farei da nossa casa um lar agradável. Posso ler romances pra você, Vilda. Cuidarei das tuas plantas... Retocar tua maquiagem. Terei o privilégio de ajeitar a alça do vestido que escorrega pelo teu ombro, deixando descoberto tuas formas conservadas. E tomarei prontamente teu beijo embebido em formol... Nada lhe fará querer estar lá fora, ausente de mim... Nunca deixarei sentir-se sozinha, nem a terra fria vai lhe abraçar... O que importa é estarmos juntos, se tenho teu coração...
Prometo, o ciúme nunca mais vai atrapalhar nossa relação. Tá... Não me controlo. Sou possessivo com o que é meu, você sabe... Todos temos nossos defeitos. Alguém tem que decidir... Confessa, você vivia na dúvida. Então precisava de um argumento convincente. Não sendo de outro, seria minha.
Tive medo do abandono, não ser querido, sem ter outra metade... O amor nos faz cometer loucuras!
Deixemos disso, devo tê-la chateado... Acho que está na hora de preparar nosso jantar.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

EXPIAÇÃO ================


Criou-te
Astaroth
para que
morre-se
fervoroso devoto
em teus braços,
Adorável Sacerdotisa.
Iniciou-te
Ishtar
flagelar-me
com penitente
lascívia
de teus
carinhos.
Sim,
sou teu
holocausto.


TIGRESA LIBERAL, procura... =====

...O cliente se foi finalmente. Não estava mais a fim de companhia. Caso o telefone tocasse jurou não atender, inclusive desconectara a internet. Amanda andava cansada daquela vida de garota de programa. Seu corpo anseia por um banho, cremes, descanso... Pretendia largar tudo, insistia consigo mesma. Mas, tentava sem muita convicção convencer-se a mudar de ramo. Vida doméstica, ter um namorado sem assustá-lo com a sua profissão ou mentir à família.
Reconfortante a ducha fazia escorrer uma cascata morna de espuma precipitada de sua púbis... Temia contudo, Amanda, as pedradas da opinião alheia. Mudaria ela, e os outros? Desconfiava se a sociedade que cospe, é a mesma que quer lamber...
Aprendera utilizar o poder de uma buceta, provedora de tão convincentes conquistas. Comprara carro, pagava contas, diferente do que se ficasse à míngua na cidadezinha natal, vendo definhar num fundo de panela seus encantos. Cedo teria engravidado dum qualquer, presa a vontade do marido... Custeara a passagem pra Capital com a virgindade, sendo um certo vereador daquelas bandas o feliz cambista.
Os primeiros passos foram em boates e pegou rápido o tino comercial do negócio. Desde quando nascera o mundo lhe cobrara um preço. Quem falou que deus dá a vida? Ela é emprestada! Todos pagam a fatura, têm lucros... Sexo requer habilidade, a tabela de serviços oferecida nos classificados contemplava massagem, sexo oral, anal, kama-sutra, menáges, dupla penetração, sadismo, acessórios, fetiches, totalmente privê...
Não envergonhava-se da vida que levava, conversa de Delegado, moralismo de dona-de-casa, não garantia o sustento dos pais. O que seria deles sem o dinheiro que ela enviava? Suor do expediente na fábrica...
Findo o banho secou-se, fez da toalha um turbante e vestiu seu robe. Acendeu a metade deixada de um cigarro de cannabis, longas baforadas inundavam o quarto num fog translúcido coado pela luz do abajur... Seus dedos cavam no pote um creme que Amanda aplica à pele. As mãos asseguravam a rigidez da carne. Aquele corpo exausto a única coisa de valor que possuía. Carreira de prostituta era igual a de jogador de futebol... Bola pra dentro! Enquanto correm atrás de você, tá bom. Era aproveitar o auge da fama.
Sua universidade fora a vida, mas bem que merecia receber o diploma em psicologia, papel mais exercido atualmente. Convencera-se serem os homens uns inseguros, achando que serão sempre os prediletos da mamãe. Por aquela cama passavam estórias inusitadas, de quem menos se desconfia... Aqueles homens emergiam pelas dobras dos lençóis.
Vinha-lhe certo conhecido empresário, cuja mulher após acidente de automóvel vivia paraplégica numa cadeira de rodas. Apesar de contrafeito mantinha o casamento para não perder o direito à fortuna.
Às quartas-feiras, um excêntrico que só ia lá vestir suas peças íntimas e ser enrabado por um consolo negróide tamanho G, de 5 polegadas.
Houve um tipo que puxou conversa esquecendo o que viera fazer ali...
Queixas pelo relacionamento que levavam, compromissados com as mulheres ditas "direitas". Percebia haver um certo cinismo, como que para melhor ser atendido em suas carências. A maioria deles pensava que ela estava ali para ser confidente. Não os queria mal, só não conseguia sentir pena. Que mais poderiam pedir em troca?...
Ah, como ela preferia que fosse à moda antiga. Um martini, aquela pegação básica duma mão invasora por baixo da pouca roupa, o acerto de contas. O fulano chegasse e se aliviasse, as vezes dependendo do tipo até gozava durante a encenação.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

FERIR-SE ================

                   
                            Ela chinga                  Ironiza - Ele.
                            Bate as portas            Faz pouco caso,
                            Lhe deseja mal.         Desvia o olhar.

Não são mais
Os mesmos
De antes...
Solidões conjugadas.
Ressentem-se.
Tanta gente por aí, justo...

                                         Por trás desse
                                         Palavrório agourento
                                         Modo de falar a sério,
                                         Medo de ouvir
                                         Sem artifícios
                                         A fatídica verdade.



POLÍTICO DE TALENTO =====

Quando um político é um ruim, seus cabos eleitorais procuram acentuar-lhes as qualidades artísticas. Há inúmeros casos e a História prova.
Pianistas, cantores, violeiros diversos, escritores etc figuram neste parnaso político.
- Mas, é um corrupto! - Contradigo eles.
- Tem gosto para a música... Toca piano.
- Sim, não nego.
- É também um homem de visão empreendedora. - Continua o outro, querendo me convencer.
- Cego para os preceitos éticos...
- De muito tato político.
- Para pôr a mão no bolso alheio.
- Compõe como ninguém! - Insiste.
- Sei... Haja visto a ladainha justificando as dificuldades e a falta de verba. Pra esconder o cinismo das prevaricações, fraudes. - Lógico, ele não se convence.

Faço minhas as palavras de Diderot, tamanha sensibilidade musical deve-se ao fato de viver entre bons músicos e má gente, daí ter ouvido afinado e coração surdo!
E acrescentando ao comentário do mesmo, eu diria:
- Fácil é aprender um instrumento qualquer. Tocar um governo a contento é que é o prodígio.  

terça-feira, 19 de junho de 2012

ULTRAJE =================







Me despi de todo traje a rigor
Este disfarce homem,
Gesto Nô.
Toda cara
Horrenda
Kabuki,
Maquiagem as vezes trágica
Uma comédia me sorrindo.
E a nua dignidade
À flor da pele
Firmei no espinho.

ZAP!... =================


Naquela penumbra reconfortante deixa-se afundar na maciez do sofá. A sala a cada instante é tingida pela luz catódica multicor vinda do altar da estante donde irradia seu olho ciclope hipnótico, um feitiço de medusa paralisante... O dedo frenético no seletor de canais do controle remoto.
Num zap permite-se conduzir. Imagens vem e vão... Propagandas, esporte, programas, comerciais, um atrás do outro...
"- Vamos conhecer agora nosso felizardo. O cupom sorteado foi..." - Muitos esperam tirar sua sorte grande numa promoção de molho de tomate... Oxalá, acasos aconteciam!
Zap!...
"- Segunda, 10:00h da manhã... Você! Tem um encontro com Deus. Que vai te livrar de todo mal... Venha até nossa igreja, amado. É a campanha em favor..." - Dentro do seu íntimo um amém pra garantir a paz da consciência e também pelos que tinham hora marcada com o Pai Celestial. Em Deus não havia o que temer.
Zap!...
"Bang!... Bang!... Bang!..." - Tiros ecoaram no filme ao mesmo tempo que um automóvel freava bruscamente na esquina do prédio. Sobressaltou-se. "- (...)Eu podia ter morrido enquanto vocês olhavam..." - Odiava esses seriados policiais...
Imagens verdadeiras misturam-se perigosamente às fabricadas. A vida como um reclame, numa sequência de notícias, fatos, vinhetas das emissoras e supostas curiosidades verídicas à margem dos umbrais da porta.
Não há distração, mas consegue desligar-se por instantes... A margarina light para as manhãs saudáveis. A cerveja et circensis a suprir seu alcoolismo latente. Dispensava presenciar os jogos nos estádios, os shows de música, teatro, pra conhecer via satélite. Refestelado em frente a tv passa de tudo, e a vida não passa... De repente, os olhos vazos de lágrimas. Sua emoção é brutalmente abalada pela invasão de uma cena de amor num vídeo-clip...
"Down on luck, I can hardly say.
 I'm down on luck, I've monopolized
 Your life too long.
 I Know that certainly
 Something's going wrong..." - Vem-lhe a mente seu passado em flash back.
Zap!...
"- Fique com a gente!... Assista mais um campeão de audiência."
Zap!...
"- Se você está disposto mudar a sua vida... Seus problemas acabaram!! E o sucesso é garantido!"
Zap!...
"- Mais saúde e forma física sem academia... Sem sair de casa! Graças ao desenho revolucionário que possibilita exercícios..." - Só de assistir ficou cansado.
Zap!...
"-(...)É científico! Estudos comprovam. Em termos de sociedade: 40% são os certinhos... Incorruptíveis. Os outros 60 por cento são de dolosos e culposos, de alguma maneira, em algum momento. Ou seja, as pessoas são falhas! Daí a necessidade de se proteger..." - Em quem confiar? O problema é que não se dava atenção aos homens de bem.
O horror que adentra o recesso do lar não lhe afeta propriamente. A miséria lá fora nada diz ao seu estômago farto. Diante das tragédias coletivas só fazia lamentar a fatalidade. Era mais uma daquelas trágicas ocorrências do folhetim diário.
Olha, mas não vê. Nada distingue da realidade... Esta desaparece.
Zap!...

sexta-feira, 25 de maio de 2012

SORUMBÁTICO =============


Preferiste um outro,
A ele presta todos os zelos.
Permiti-lhe cochichos,
Intimidades...
Enlouquece-me suportar
Tamanha simpatia,
Privilégios.

           Tento mascarar um sorriso,
           tapear com votos de que sejas feliz.
           Mas, o peçonhento ciúme
           explode em furor
           e nada pode me salvar.

Não sei ser generoso...
Excluído,
Ameaçado,
Vivo tomado de maus sentimentos.
O véu negro da fatalidade
Enevoa meus pensamentos...

           Bem, você não necessita de mim.
           No entanto, se a morte
           te ceifasse quem sofreria
           mais tua perda senão, eu.

EX-AMOR MACHINA =========

Será que o amor só resiste nas novelas?... Amores feridos muitos nas canções das rádios... - Meditava algumas noites sobre o travesseiro, como naquela madrugada.
Palpitante em seu peito a angústia por não estar recolhido noutros braços, seus pensamentos a evocar inquietantes recordações... O enlace matrimonial num sábado de outono. Caia a tarde e a avenida central iluminou-se no instante que a limousine levava o casal para as núpcias... Os primeiros anos de amor compartilhado... Descobertas desagradáveis. O timbre insuportável da voz dela a lhe procurar. As infinitas tentativas de sondar-lhe a alma na intenção de assegurar-se dos sentimentos dele para com ela, como confissões arrancadas a todo custo... O sorriso dela a desvanecer da cara. E o conto de fadas tornar-se um filme de horrores com aquela figura tétrica da esposa a lhe obssediar.
Seu casamento um romance mal escrito, eram propícias as diferenças conjugais pra se discutir a relação. Numa dessas vezes, olhava umas fotos duma revista de peladonas famosas. Sua imaginação recriava vivamente aquele corpo impresso, a admirar como uma jóia que nunca pudesse ter... Deparando-se perplexa com a cena, a mulher recriminou-lhe:
- Tá gostando?...
Sem palavras a expressão dele fora de aprovação.
- Quê que é, deu pra essas coisas agora!?... É algum tipo de maníaco sexual? - A neura definhara a sensualidade das linhas do seu corpo, ela inferiorizava-se ante a exuberância irreprimível da modelo.
Sem levantar as vistas ele respondeu:
- Não vejo nada errado nisto. - E não era um conceito moral... A conjuguê partiu pra briga. O primeiro round não foi propriamente de debates, até que ela se acalmasse.
- Na cama não sou eu que você vê. É a gostosona da revista. - Protestava indignada.
- Se fosse verdade, eu não brocharia tanto... - Escapou-lhe!
Quanto da afeição pela esposa tornara-se repulsiva. Da piada oportunista à sinceridade cruel, sem palavras medidas até cair a máscara da aparência, culminou num divórcio conciliador.
Determinadas relações amorosas perduram como se os nós dos destinos cruzados fossem difíceis de desatar, apesar do desenlace matrimonial.
- Você está lavando roupa pra fora? - Perguntou desconfiada noutro dia.
- Por quê?
- Estou vendo sutians e calcinhas no varal.
- Nós estamos separados, sabia?
Estranhamente ela agora se dispunha solidária aos seus sonhos e se mete a dar conselhos na vida sentimental dele.
- Ah, meu querido! Você pretende cometer o mesmo erro duas vezes?... Falo porque eu te conheço. Sou tua amiga. - Assim, duma desagradável intromissão.
E do litígio à separação definitiva... Quer dizer, tudo ainda são motivos pra lhe solicitar com frequência: o filho tirou nota ruim na escola, precisa comprar tal remédio, o garoto não obedece... Ela parecia cada hora mais presente.
Os dígitos do relógio na cabeceira deram outra volta completa, o rádio tocara uma infinidade de músicas e cães despertos latiam ao longe, ele procurava aquietar o cérebro, livrar-se dos pensamentos... Todas as privações eram suportáveis, exceto amar. Queria sentir de novo o prazer da paixão, completar-se na pessoa amada. Nada havia acontecido como no happy end dos filmes. Talvez o que acontece na tela foi feito pra não existir realmente... O cupido traiçoeiro erra de alvo... Arriscaria encontrar um alguém?... - Até as idéias afundarem-se no lago escuro do sono.
Nisso adormeceu, à espera, no outro dia, da visita semanal do filho.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

FORTUNA =================


                               Desidério
                               Puxa sua carroça de tranqueiras,
                               Não tem cavalo.
                               Só a si mesmo
                               E o lixo que lhe dá comida
                               A pedido da fome.
                               Quando rumina a praguejar
                               Aquela maldita sorte,
                               Contrária a ferradura
                               Pendente no pescoço.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

SÉRIE REPLICANTE =========



Ouviu um bip - "...Hora de recarregar as baterias. Algumas das minhas funções já estão em estado crítico..." - Recebeu o andróide aviso do Programa de Sobrevivência. Perto havia uma cabine com conexão elétrica, girou o plug no encaixe e o tênue campo magnético dos seus circuitos oscilou ionizado provocando ondas de elétrons. - "...Isto sim, é estar ligado à vida... Acionar Sistema de Armazenamento Suplementar..."
Além dos arranha-céus, sobre os out-doors holográficos, o ar denso e tempestades elétricas precediam o intermitente temporal de chuva ácida.
Ciborgue projetado para atender necessidades especiais, modelo de tarefas múltiplas incansável, catalogado em qualquer Seção de Arquivos Funcionais dispunham-no das maneiras mais sórdidas. Executor, como outros daquela série, de todas as tarefas rotineiras e de setores insalubres da produção, sua mera condição serviçal fazia dele uma máquina exótica. Virtualmente idêntico a um Ser Humano, porém sua essência carecia humanidade.
"...Se bem que, o funcionamento da máquina humana é uma vida de carências, que para evoluir e satisfazer-se depende do funcionamento do sistema de órgãos e a conservação do organismo..." - Apreendeu o humanóide de uma das definições programadas.
Novidade da evolução robótica suas lembranças eram implantes de memória humana, sexualmente castrado todo e qualquer comportamento mimético era pura ilusão virtual. Enquanto os Humanos tinham família, deitavam e entrelaçavam seus corpos, eles os humanóides vagavam pelos becos úmidos a comparar informações de sensações emotivas no seu banco de dados...
ALEGRIA sf. 1. Qualidade ou estado espontâneo de quem tem prazer de viver, de quem denota felicidade. 2. Contentamento, satisfação... - Seguido de diversas imagens de pessoas sorridentes: velhos, crianças, mulheres. Algumas vezes até tentou esboçar corporeamente tais manifestações, porém não fora programado, estava privado delas... O que havia de verdadeiro nestes implantes?
"...Adaptaram-me sensíveis circuitos receptores e decodificadores de gosto e aroma. Fizeram-me viver e sentir um mundo do qual não posso usufruir... Quem se esmeraria em produzir seres assim? Sem o que chamam de Alma para não despender nenhuma preocupação. Parece que lhes falta sentimentos... Só havendo o exterior pelo exterior em que diferem dos vegetais?... Dos robôs?
   

terça-feira, 3 de abril de 2012

ZOOn POLITIKON ==========










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                                                               PÚBLICA.


O BEM-AVENTURADO ========

Situação difícil!... Vinha manco pela rua, o chapéu inclinado na testa, cobrindo a aparência. Tudo quanto fez de esforços dera em nada, depois de ter perdido seu ganha-pão como camelô. Há semanas vivia ao relento sem sombra, nem residência, uns poucos pertences dilapidados.
O dono do cortiço onde morou não quis nem tomar conhecimento. Cada inquilino ali tinha sempre uma desculpa pronta, um tenha piedade pelo infortúnio, reclamava o proprietário. Se amolecesse o coração quem viveria na dureza seria o próprio.
- ...Ajudo a quem me ajuda. Se faço e você não retribui, fico eu no prejuízo. - Repercutia a voz dele em seus pensamentos, o quanto o homem se esforçava por parecer justo. - Também devo contas. Não posso contar com o "Deus lhe pague"... - Despejara uma família tendo duas crianças pequenas, não deixaria de fazer o mesmo consigo. Findo o prazo abertas estavam as portas da amargura.
Lembrou-se indubitavelmente do avô, ainda vivo em remotas recordações, costumava ilustrar os acontecimentos da vida por intermédio de sua filosofia proverbial.
- Nessa terra, rapaz... Cada um puxa a brasa pra sua sardinha. - Referindo-se ao egoísmo das pessoas abastadas. - Isso quando tem peixe no braseiro! Senão, cada qual pega dum lado da sardinha e quem fica com a espinha é o pobre... - Pilheriava o ancião... Viu-se transportado à mocidade na companhia do avô, sob a proteção da ignorância daqueles idos. - Rico quando morre a gente lamenta. Agora, o pobre nóis diz que partiu dessa pra milhor. Mode que se livrou das dívidas, de muito passar necessidade. - E ria sem maior rancor.
Essas vozes e visagens advinham do jejum... Tinha vergonha de si mesmo ao sabor da desgraça. Pedir esmolas seria seu último recurso, apesar do estômago reclamar oco de fome. Lá no íntimo relutava, não parecia nenhuma criança carente... Era somente sentar e estender a mão. Ouvira falar de mendigos que simulavam feridas nas pernas utilizando carne podre e toda sorte de artimanhas.
Dobrou uma esquina resistindo ao desequilíbrio da muleta, quando teve um mal-súbito e caiu desmaiado no alpendre duma portada.
Dali 2 horas recobrou os sentidos... Seu chapéu caíra, o borco pra cima. Dentro da copa dinheiro que os passantes haviam depositado em nome da caridade, pelo menos aquele dia.

sexta-feira, 23 de março de 2012

LEGENDA =================

                          - Eu te amo!...
                          Proferem por aí
                          Todas as noites
                          Nas novelas
                          A frase insuportável
                          Da felicidade amorosa,
                          Aparentemente também correspondida.

                          Voz do gozo indescritível
                          Que fala e diz o sintoma.
                          Paradoxo a expressar
                          Sua verdade
                          Em si mesmo,
                          Sem substituições.

                          Salta depois da língua
                          Numa acrobacia arriscada
                          Sem rede de proteção.

                          - Eu te amo.
                          Quero ter de mim
                          Plena certeza.
                          É o que de ti espero.


TODO CUIDADO É POUCO =====

Escondido atrás de circuitos fechados de tv, Prudente se prende em casa devido a onda crescente de violência. Um meticuloso sistema de alarme e senha garantem a inviolabilidade do recinto. A cêrca elétrica entorno da residência inibira a invasão dos gatunos e torrara alguns bichanos desavisados. Supunha que estar afastado do problema era se livrar dele. Planejava seriamente mudar-se para um condomínio privativo, embora estes também fossem alvos dos ladrões.
Assumiu verdadeiro pavor de andar na rua. Protegido num carro blindado seu trajeto para o trabalho é esquemático, do estacionamento ao elevador e daí para o escritório. Quase já não ia às compras, pedia o que necessitava pelo delivery, ou no shopping virtual on line. Aboliu o dinheiro, pagava tudo com cartão de crédito. A diversão garantida por um sofisticado home theater e uma centena de filmes em dvd, mais os infindáveis canais da tv a cabo.
Enquanto dorme tranquilo, dois ferozes rotweillers soltos no quintal guardam seu sono dos justos. Foram especialmente treinados para um ataque mortal pelo adestrador de uma empresa especializada em proteção pessoal, cujo conceito era tolerância zero com o crime. Às 18:00 horas um mecanismo de temporização solta as feras do canil, e o acesso protegido para a casa dá-se pela garagem, num pequeno hall interno.
Lera num site que muitas pessoas eram assassinadas, na maioria dos casos, por conhecidos da vítima. Ciúme, inveja, vingança... Passou a temer a proximidade demasiada. Prudente só relaciona-se pela internet e fez inúmeras amizades. Adorava teclar na segurança oculta do chat. Algumas vezes ele se exibia disfarçado em frente a webcam, ou trocava fotos fakes com correspondentes do seu profile... Mas qualquer desconfiança era motivo de precaução. Entrou em pânico no dia que não reconheceu o telefone da mãe no detector de chamadas, ela trocara de celular, temia sofrer uma ameaça de extorsão financeira.
Numa noite escura, bêbado e tendo perdido o controle remoto do portão basculante ao conseguir adentrar sorrateiramente com muita dificuldade o quintal - sem ser reconhecido foi dilacerado pelos cães.
   

segunda-feira, 5 de março de 2012

FÊMEO ===================

                                              Evas recatadas
                                              Hábeis gueixas
                                              Sutras lindas
                                              Liberadas pretensas
                                              Confusas no divã.
                                              Que as mulheres são diferentes,
                                              Mas continuam as mesmas
                                              Apesar dos pesares.
  


COMO OS LÍRIOS NO CAMPO... =====

- Como você se vende ao mercado? - Reverberava sonora a questão por sobre o auditório, sob avaliação imprecisa da audiência...
Há meses desempregado padecia as cobranças do fracasso. Contas no prego, endividado de promessas feitas, graças a ruína de conglomerados financeiros na volatização dos capitais. Pensamento positivo, extenso curriculum, livros de auto-ajuda, apelara pras mais diversas estratégias a fim de se recolocar na cadeia produtiva. Juntou os últimos centavos e inscreveu-se numa palestra motivacional, com um desses Phd em Rh, Marketing Pessoal & Co.
- Quem é você? Qual o é seu valor?... Você também é um produto vendável. E tem que saber se vender! Mostre o seu diferencial... Você precisa de uma ótima oportunidade pras pessoas te comprarem. - Tantas perguntas certas das respostas não pediam outras explicações. Alguns olhos aqui e ali brilhavam vetrificados... - Se você aí sentado não tem valor, você está morto!... - Temeu decretada sua falência pessoal.
- Eu sou uma águia predadora! - Viu-se repetindo, os dedos das mãos crispados em garra, a interagir com os demais participantes naquela selva de medos.
- Seja como o Bambu-chinês fortaleça as raízes e cresça para as alturas. - Emocionara-se com as parábolas consoladoras de Paulo Coelho e filmes mostrando as superações de deficientes físicos, a duvidar de quem nem todas as deficiências são aparentes. Num dado momento o palestrante chegou a exemplificar que salário era um detalhe, como o Técnico Parreira dissera a despeito do gol...
- Faça por merecer e o céu será seu! Nenhuma recompensa vem antes do trabalho dignificante... Você precisa ser escravo da sua ambição para se tornar livre. E só assim garantir um futuro lucrativo.
Não pode deixar de reparar que o palestrante estava bem empregando, esbanjando otimismo... Ultimamente sente inveja mesmo da sorte dos bichos, das plantas, os quais sobrevivem ao relento na natureza sem quase nenhum prejuízo. Até os lírios-do-campo foram elogiados por sua santa ociosidade.
 

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

SÚTIL ====================






O amor é Kitsch
Cafona
(Démodé?)
Mas a qualquer um
Veste bem,
Prêt-à-porter.
Griffe que
Nos põe a nu
Perante o outro.

NUM MOMENTO DE POBREZA =====

Estar por cima mesmo, aparentar sucesso custava caro - somente artigos de primeira necessidade. Relógio Rolex, pra melhor aproveitar o precioso tempo. Guarda-roupa sortido, Christian Dior, Yves Saint Laurent, sapatos Church's. Sua persona rescendia perfume Channel ao saltar ligeiro do Jaguar XJ40.
Fina estampa nas colunas sociais, quase não se vê seus olhos por trás do Bausch & Lomb. Wings Gold, de lente turquesa. Boa-pinta, o tal coleciona ainda namoradas esculturais.
Com um grande círculo de amizades importantes movimentava a alta roda do jet-set. Hipotecário do capital alheio fazia girar a roda da fortuna e a roleta dos cassinos de Punta del Leste. Dono de uma personalidade cativante, ele divertia a elite da cidade com aventuras das viagens em roteiros turísticos exóticos. Tudo ao sabor de pratos sofisticados e taças de vinho da Borgonha.
Apesar de toda sua renda, seus gostos requintados davam trabalho. Pelas lojas dos shoppings garimpava vestuário de grifes, jóias, gravatas finas. Era comprando simplórios presentes aos amigos que dava caros presentes a si mesmo. Com a distração da vendedora surrupiava esses mimos mais valiosos... Num mundo capitalizado mera questão de economia. "A oportunidade faz o negócio", lhe inspira um neurolinguista de auto-ajuda, o qual lera muito.
Numa dessas foi pego. Ganhou mais quinze minutos de fama. Logo apareceu um advogado, alegou ter sido por brincadeira. Veja, você!... Um teste com as câmeras de segurança... As desculpas, leve arranhão na imagem. Assunto dos happy-hours tomado como extravagância peculiar, estilo.
Se a moda pega, conforme senteciavam antigamente e Bezerra da Silva cantava naquele samba... Pois é, estatística de Delegado, até rico tem seu momento de pobreza.
   

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

HOMONORMALYS ============


Ele se considerava
Um cidadão acima de qualquer suspeita.
- Caro, Senhor!
Que é isso!? Não fumo
E nem bebo...
Nenhum vício. - A seu juízo.

Demais nunca amo,
Prefiro não correr tamanho risco.
Honesto enriquecido
Com as contas às vezes me engano, me desculpe!

É... Tenho um voraz apetite,
No meu café apenas substituto
Que adoce minhas palavras.


Sou feliz, sobretudo
Me ensinaram a sorrir.
No impossível
Deposito minha fé, 
Não fosse essa miopia...
Mal enxergo as coisas.
Vai ver, é da idade!

ARQUIVO MORTO ===========

Uma vida inteira dedicada ao trabalho. Empregara-se como escriturária, entregue servilmente a rotina dignificante crente de cumprir o seu papel.
Todavia, nunca galgara maiores postos no setor público, apesar de diplomada em duas faculdades. Os melhores cargos sempre ficavam  praqueles outros envolvidos em arranjos partidários. Contudo, a língua não lhe obedecia contrariar, faltou-lhe o apadrinhamento político.
Agora, numa tardia constatação viu-se diminuída frente aqueles anos todos. O que era tornar-se uma ex. Ela não se distinguia alijada da conferência de documentos e arquivos.
Dona de uma figura pouco interessante, cujos méritos consistiam em destrinchar o trâmite burocrático. Era dada a fantasias românticas compensatórias. Nutria pelos colegas de repartição um amor ultra-secreto. Eles a rigor iam pra cama com todas as descompromissadas e algumas infiéis, exceto ela. O que fizera dela uma solteirona, menos por convicção do que contingência...
"Por que me deixei enganar? Só servi para favores... Nojentos! Depois desdenhavam de mim, sem me dirigir palavra. Malditos homens, seres cheios de fraquezas!" - Pegava-se dizendo para si mesma. Ensimesmada naquilo que acontecera. Estabelecidas frouxas relações de amizade, ninguém lhe era íntimo. Nenhuma parte dela havia no mundo... Quem usufruiria da apólice de seguro feita?
- Ganhaste a sorte de não fazer nada... - Insinuou o Diretor do Departamento certa inveja dissimulada, durante o aperto de mão ao parabenizá-la pela merecida aposentadoria.
Sua despedida se deu quase no anonimato, a não ser por três ou quatro assinaturas numas vias coloridas. Ela já não consta mais na lista de aniversariantes do mês. Era como se tivesse morrido. Ninguém lembraria dela.    

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

GRAFITE =================



Nestes rabiscos
Com os quais me declaro,
Grifo.
Substantivo cardiáco
Trespassado por maldade,
Amor irremediavelmente
Infartado.


A FÉ INCENDEIA MONTANHAS =====

Descrente das campanhas evangélicas e de ser tiéte de padres artistas, Bárbara decidira voltar as raízes religiosas da ancestralidade afro-indígena.
Sua fé renovada resolveu apelar para algo mais ligado às forças da natureza, por contemplar o sentimento ecológico vigente.
Conselheiro, Dr. Honoris causa das doutas ciências esotéricas & afins, recomendara um trabalho na mata.
Pouco antes da meia-noite, acompanhada de Conselheiro e dois jovens "cavalos" necessários para a cerimônia, embrenharam-se no mato a fim de fazer o despacho.
Servida a ceia eucarística com farofa e uns bons cálices duma garrafada de raízes visionárias, Bárbara acendeu tudo quanto é tipo de velas para o guia de luz. Caboclos, caciques, enxergavam perfeitamente a nudez da pomba-gira naquele lume. Enquanto ela saracoteava febril, tomando passes buliçosos e entregue aos delírios do ménage espiritual. A lança guerreira e o tacape rijo invocavam na noite gozar as dádivas terrenas... Saciados da incorporação divina largaram lá as oferendas como presente às entidades da floresta.
Pela manhã durante o café, surpreende-se com o plantão extraordinário da tv:
"- Interrompemos nossa programação para informar, que um incêndio de proporções alarmantes, neste momento, põe em risco a Reserva Florestal do Teiú..." - O repórter abordo num helicóptero, mostrando as imagens do sobrevôo pela área queimada. Só foi o tempo de um exclamativo putz!... E Bárbara engasgar com o café.