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terça-feira, 19 de junho de 2012

ULTRAJE =================







Me despi de todo traje a rigor
Este disfarce homem,
Gesto Nô.
Toda cara
Horrenda
Kabuki,
Maquiagem as vezes trágica
Uma comédia me sorrindo.
E a nua dignidade
À flor da pele
Firmei no espinho.

ZAP!... =================


Naquela penumbra reconfortante deixa-se afundar na maciez do sofá. A sala a cada instante é tingida pela luz catódica multicor vinda do altar da estante donde irradia seu olho ciclope hipnótico, um feitiço de medusa paralisante... O dedo frenético no seletor de canais do controle remoto.
Num zap permite-se conduzir. Imagens vem e vão... Propagandas, esporte, programas, comerciais, um atrás do outro...
"- Vamos conhecer agora nosso felizardo. O cupom sorteado foi..." - Muitos esperam tirar sua sorte grande numa promoção de molho de tomate... Oxalá, acasos aconteciam!
Zap!...
"- Segunda, 10:00h da manhã... Você! Tem um encontro com Deus. Que vai te livrar de todo mal... Venha até nossa igreja, amado. É a campanha em favor..." - Dentro do seu íntimo um amém pra garantir a paz da consciência e também pelos que tinham hora marcada com o Pai Celestial. Em Deus não havia o que temer.
Zap!...
"Bang!... Bang!... Bang!..." - Tiros ecoaram no filme ao mesmo tempo que um automóvel freava bruscamente na esquina do prédio. Sobressaltou-se. "- (...)Eu podia ter morrido enquanto vocês olhavam..." - Odiava esses seriados policiais...
Imagens verdadeiras misturam-se perigosamente às fabricadas. A vida como um reclame, numa sequência de notícias, fatos, vinhetas das emissoras e supostas curiosidades verídicas à margem dos umbrais da porta.
Não há distração, mas consegue desligar-se por instantes... A margarina light para as manhãs saudáveis. A cerveja et circensis a suprir seu alcoolismo latente. Dispensava presenciar os jogos nos estádios, os shows de música, teatro, pra conhecer via satélite. Refestelado em frente a tv passa de tudo, e a vida não passa... De repente, os olhos vazos de lágrimas. Sua emoção é brutalmente abalada pela invasão de uma cena de amor num vídeo-clip...
"Down on luck, I can hardly say.
 I'm down on luck, I've monopolized
 Your life too long.
 I Know that certainly
 Something's going wrong..." - Vem-lhe a mente seu passado em flash back.
Zap!...
"- Fique com a gente!... Assista mais um campeão de audiência."
Zap!...
"- Se você está disposto mudar a sua vida... Seus problemas acabaram!! E o sucesso é garantido!"
Zap!...
"- Mais saúde e forma física sem academia... Sem sair de casa! Graças ao desenho revolucionário que possibilita exercícios..." - Só de assistir ficou cansado.
Zap!...
"-(...)É científico! Estudos comprovam. Em termos de sociedade: 40% são os certinhos... Incorruptíveis. Os outros 60 por cento são de dolosos e culposos, de alguma maneira, em algum momento. Ou seja, as pessoas são falhas! Daí a necessidade de se proteger..." - Em quem confiar? O problema é que não se dava atenção aos homens de bem.
O horror que adentra o recesso do lar não lhe afeta propriamente. A miséria lá fora nada diz ao seu estômago farto. Diante das tragédias coletivas só fazia lamentar a fatalidade. Era mais uma daquelas trágicas ocorrências do folhetim diário.
Olha, mas não vê. Nada distingue da realidade... Esta desaparece.
Zap!...