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segunda-feira, 10 de novembro de 2014

ONIPRESENTE ============


                 Há alguém
                 Que me olha
                 Lá de cima...
                 Em órbita
                 Meus atos.

                 E não é a onipresença
                 De tal Deus,
                 Mas o zoom
                 De um satélite denunciante.


FÉ PÚBLICA ==============

Debaixo dos céus, a cidade fervilha de suas gentes. Inclemente sol por testemunha celeste neste trabalho dos dias. Em seu coração conflitam percorrendo as artérias congestionadas. Os subúrbios apascentados, ruminantes da sina cotidiana.
Houve que um avião ao tentar aterrissar na precária pista do aeroporto encalacrado no tecido urbano fez tremer, abalou as estruturas quando arremeteu desesperado passando próximo, num voo rasante sobre o teto da Casa do Povo. Vindo abaixo o enorme crucifixo pendente na parede do Parlamento. Num Deus nos acuda!
Naquele nobre edifício, no qual no momento da catástrofe importantes debates legais estavam em curso. A reforma da moral municipal. Enobrecer o sentimento cívico. Por decreto das boas ações: doenças, mendicância deviam findar já, ao transcorrer da esferográfica.
Surpreendidos deram fé duma triste realidade. Do falatório hão de mover fundos e mundos como por milagre, até anjos doravante pousariam em visita...
Talvez por isso mesmo, este semi-deus secularmente convalescido, ele próprio aguarde socorro dependurado por pregos nas salas de espera dos hospitais.
Pensadores confabulavam entre si. Pelas esquinas fomentam idéias a voz popular queixosa. Àqueles ciosos da ajuda divina... Pra quê tantos deuses? Que só sabem ouvir as razões do Estado. Quando seu corpo de sacerdotes se calam convenientes ante o clamor da praça pública. Concubina perdulária da República. Querem apenas o conformismo. Nada duvidar. Impor às mulheres escravidão moral e aos homens indigência política. A manipular a fé e os dons. Oferecer o império inalcançável das divindades. Qual a serventia de um deus que não pode ser visto ou alcançado? Deuses refugiados nos espaços siderais, fabulosos profetas em páginas de papel ao apetite voraz das traças do tempo...
Erguidos palanques já não é a Constituição, mas a Bíblia que os governam. Obra do Arquiteto maior!? Bradam versículos, empobrecendo os direitos dos cidadãos. Em Cortes de Leis, magistralmente a espada da Justiça paira acima das cabeças e a balança pende nas mãos dos Juízes confundindo-se com a suposta Lei divina.
Vive a cidade seu opróbrio existencial... Ai de ti, urbe!! Por entregar tua vida a tutela de um rei estrangeiro mortificado. É na Terra, e não fora do planeta que se regem destinos, faz-se escrituras. Pois, só no paraíso as ruas são pavimentadas com ouro, sarjetas de platina e cada qual tem sua morada, sendo a luz o alimento. 
Reza assim o contrato, das coisas terrenas é com César eleito que se trata.
  

terça-feira, 19 de agosto de 2014

EU & ... ================


                                         Teu beijo,
                                         Coração pela boca
                                         Me revela
                                         O vazio habitante
                                         Dentro de mim.
                                         Meu Eu quer
                                         Completar-se
                                         Em Ti.


MEDÉIA URBA[i]NA ==========

Mãe, nem encoxada no tanque! Para os mais complexados Édipos antiquados. Fulana vivia uma tragédia pessoal. Até de figurar nas matérias dos noticiários baratos.
Naufraga numa mesa de bar. Mateus, chora a seus pés à deriva, enquanto uma irmã grata tenta demovê-la daquela tonteria e cuidasse da criança que acabara de trazer para embalar.
- Tá certo isso? Você aí ao invés de cuidar do filho.
- É problema meu!...
- Tu quer dar fim ao infeliz.
- Que se dane!... Já era. - O que são só palavras, quando malditas...
O fruto com outro homem, daquele que crava punhal no peito tatuado impedia que fosse feliz, por certo, com seu Amásio que o rejeitava. Incapaz dum afeto.
- Pra ficar comigo tem de ficar quite. - No seu achar leonino.
Mateus olhava em sua inocência espantada. Qual ódio despertaria suas brincadeiras... O "puta-que-o-pariu" sobre a mesa, seu brinquedo.
Jogou com severidade a criança numa cadeira a fim de aquietá-la. Praguejava ter de carregar o menino.
- Por que não dorme, hein?... - Como poderia haver tanto desamor naquela mãe? Toda sua indiferença por aquela semente do coração antes ferido. Era fazer vingar, mesmo regada em sangue, a flor de amor do Amásio.
- Isso é jeito de tratar um filho.
- Não tô nem aí. - Pois sim, descobriu quando teve o filho abrigar verdadeira impaciência pela aporrinhação dos pirralhos. Sugou-lhe o pouco das formosuras do corpo judiado. Se soubesse teria abortado... Alguns pensamentos causavam medo. Queria curtir, aquele "dar mais do que chuchu na Serra", viver o jardim das delícias.
Segundo o Amásio, um banana quando quer, tudo aquilo era arranjo dela. Obrigava que o tal pagasse um pirulito para adoçar Mateus.
- Pensa que é só parir? - A irmã condenou, e não seria a primeira pedra, deixando a birosca.
Ao sabor da maré, o infantil, descalço pelo ladrilho do estabelecimento, como se fosse seu playground.
- Vamos, Bem... Deixa Mateus por aí mesmo. - Brinca mordazmente sincera. O rosto de Mateus se desfaz numa quase lágrima. Nem todo seio é próprio para toda boca.
- Daí se demove da idéia. Que se curasse da saciedade dos desejos, deu um último gole... Não queria criar um "Caso de Família" com as Autoridades. Engancha o rebento nas partes da roupa e leva a cria. Ele ainda valia uma Pensão Alimentícia.
        

sexta-feira, 20 de junho de 2014

PARADOXO ============





O Humano demasiado,
matáfora do Universo
sobre todos nós.
Medida imprecisa
das coisas.
Maravilhoso
e perverso,
condenado por suas
justas razões.

"JÁ TE FALEI, MALANDRAGEM!..." =====

O cara dizia que me daria uma letra. Descolado num monte de mutretas, quásquásquás!... Vire e mexe tomando sacode.
Eu filmo ele. Tou de olho na "fita" dele. Eu manjo o figura. No bairro que o viu crescer, sabiam da sua real possibilidade. Mas ele achava que tinha talentos e podia mais... Nada disciplinado, pelos campos da várzea por "canelar" a vida se via um craque do futebol e nisso alimenta seus ingênuos sonhos de sucesso... Aquela puta sorte!
Da escola aprendera alguma leitura, porque quem ensinava o proceder eram as leis do mundo. Acostumado nadar contra a maré, contudo se sentia um peixe fora d'água... Mangueia sua existência pelo cotidiano dos bares e recantos urbanos.
Deu uma espiada no tablóide popular gratuito da barbearia, afim de conferir o Caderno Policial e os entreveros da "Família"...
- ...Na cadeia tem uma placa assim, morô: "Carceragem - Não entre."... Só se o bandido não soubesse ler! Como alguém quisesse perder tempo ali!? - Oportunidade para refletir suas máximas e dar aquela boa olhada na "gostosa" estampada numa das páginas, demais amarrotada por passar de mão em mão. Entediado da punheta vendo vídeos pornôs pirateados.
- Hoje tem navio, malandro! - Alertava os trutas na sbórnia sobre a estiva no Porto. Mas ele está pronto mesmo era prum "avião". Naquele dia nenhum teco... Dispara na velha bicicleta esquivo da averiguação das viaturas. Uma vez na mente se livra do flagrante, sem muito dispensar...
O negócio dele era garantir o seu. Ainda que não lhe dessem um centavo. Todavia, nem por bancar o esperto, lhe sobrava tanta esperteza. 
Sabe que põe o pescoço à risco. Chega apresentando uma jóia num embrulho, dizendo que é ouro e vende a preço de banana. Quem quer comprar ouro de tolo?... O dono do bar percebendo ser verdadeiro, diz ao cujo que aquilo é bijuteria. Golpe do malandragem acostumado nessa. Só pra comprar a dita fácil, não vale pois quilate... O marginal vira-lata passa a mão nuns cobres garimpando seu quinhão. Garantido o salário, vendeu barato o otário que a palavra não tinha valor.


domingo, 4 de maio de 2014

CRÔNICA QUINTA NA BIROSCA =====



Por que não ser querido?
Se feio não era,
Nem outra qualquer deformidade.
E ainda que contivesse
Aquela alma fêmea
A debater-se nas vestes masculinas,
Seu desejo entre iguais
Por sentir não o diferia...
Chorava suas mágoas num copo
On the rocks no seu caminho.
Malgrado todo esforço de ternura,
A mais "piranha" não competia...
Agarrou-se aquela máscula braguilha,
Salva-vidas de tamanho desespero.
O macho de saco-cheio
Pondo fim a relação
Encheu-lhe de sopapos,
Rudes carícias.
Mas, o hematoma era só
Uma marca aparente
Sobre a dor.  

"UM DIA DE CÃO!" ========

Odiava preencher relatórios, formulários. Explicar-se ao Delegado como um meliante, questionada sua conduta. Ser incriminado por aquela jocosa fatalidade. Alguém atrás de uma escrivaninha reconhece as dificuldades do trabalho nas ruas?
A cidade vivia agitada com alguns crimes. Os âncoras do noticiário policial em nome da audiência clamavam Justiça a todo custo. O Comando pedia resposta rápida, tolerância zero. Não se foge a responsabilidade.
Meu parceiro no meio do expediente tivera um desarranjo estomacal, ficou em observação no P. S. Por isso não me arriscava comer nada de ambulantes na calçada. Uma espécie de gentileza oferecida pela proteção dada. Nesse mundo cane é preciso ter estômago.
Por volta das 18:22 h., eu dirigia patrulhando já de retorno para o fim do turno. Caía aquela garoa fina, mesmo com o pára-brisa acionado gotículas cintilantes atrapalhavam minha visão, decerto o desembaçador funcionava mal. Uma voz feminina pelo rádio da viatura alardeava ocorrência.
No início do quarteirão à frente havia uma loja de animais, ia trafegando quando vi no estacionamento sair uma caminhonete vinho e o que parecia notas de dinheiro voando, o motorista desesperado por pegá-las... Como iria adivinhar que tinha sido o troco deixado sobre o painel!? Aquilo só me despertou suspeitas. Uma coisa é certa, nessa profissão a gente aprende, nem todo mundo é tão honesto quanto parece.
Fechei o veículo, então dei voz de prisão e o indivíduo de mãos para o alto, assustado abriu a porta... Saiu ligeiro de dentro um cachorro grande, maior que o normal.
O animal saltou com suas patas em cima de mim. Rodopiou. Fazia uns sons abrindo a bocarra, mostrando os dentes... Arrghhh!! Uf! Uf!... Au!! Au!! Au!! - Fora de controle. Era da raça Bernese, soube depois. Considerei hostil. Um único tiro. Soltou um ganido doído e caiu.
O tal sujeito uivava desconsolável, como se tivesse perdido um ente querido. Quis dizer-lhe, entre lá e compre outro... Eu pago! O que deu nele? Sentira odores estranhos da minha colônia vencida, ficando excitado sob o efeito anestésico para o tratamento dentário?
Nunca passou pela cabeça colocar a sociedade em perigo. Apreenderam meu revólver. Agora olham para mim com essa cara de poucos amigos... Mas quando o "bicho pega", querem me atiçar contra os outros. Me pergunto se deveria recorrer aos cães para ter um amigo fiel. Acho mesmo que necessito dumas férias.
    

quarta-feira, 2 de abril de 2014

ARRANJO FANTASISTA ======


A Natureza Morta
Está viva de frutas maduras
Para que dure sempre
Na lembrança
De íntimas coisas
A existência palpável
Seu gosto palatável.
Do perfume imóvel
Das flores extintas.
Lindamente seres abatidos
Do matiz incorpóreo
Que nos despe.
Quando tudo estiver morto,
A arte há de realizar nova vida.


O MOTORISTA DO FUSCÃO PRETO =====

Aquele blecaute já durava mais de horas. Noite adentro a cidade anda às escuras, semáforos cegos, olhos-de-gatos furtivos acendiam na escuridão.
Um estranho dirige seu Volkswagen Fusca preto premeditando no breu das ruas. Numa e outra esquina, o halo vermelho dos giroflexes das viaturas policiais tingiam a figura sombria dos transeuntes. Pela extensão vaga da avenida o farol rasga a paisagem noturna...
Quem é ele? Um anônimo. Embora retraído até casou-se. Malogrado, pois era dado a poucos afetos. Agora vive terrivelmente solitário. O vulto no esquecimento urbano.
Há muito povoava seus pensamentos cometer um assassinato. Alguém desconhecido. Talvez, um desses maltrapilhos inúteis. Somente para vê-lo morrer.
- A quem esse trapo poderia fazer falta?... Estão sempre a espantar as pessoas. O infeliz mesmo deixou claro sua não serventia ao mundo. - Conversa com o reflexo no retrovisor do carro.
Já tomou sua decisão... Lateja-lhe o sangue nas têmporas. A transpiração escorre sob o terno que veste. Optou pela esganadura, eficiente, silenciosa... Bêbado e debilitado não teria o farrapo humano forças para resistir. Esse homem age por compulsão incontrolável. Tomado dum instinto predatório. Está disposto a descer ao esgoto do seu íntimo para saciar suas perversas vontades. Queria ouvir o coração batendo desesperado por vida, um último suspiro. Conter o derradeiro esforço daquele corpo... Igual quando moço afogava filhotes de bichanos no lodo dos charcos.
Nessa mesma madrugada deserta esgueira-se sob a luz da lua, sorrateiro pelas sombras... Empunha uma gravata tesa entre suas mãos. Mais adiante um mendigo dorme sozinho, presa de seus próprios sonhos de fartura.
Enquanto apertava, o sujeito se perdeu nas órbitas interrogativas daqueles olhos esbugalhados. Suas narinas queimam com o cheiro acre intenso de suor curtido... E ao largá-lo inerte, vem uma súbita náusea a revirar-lhe as tripas.
Por fim recuperou-se... A sensação é prazerosa, endireita a imagem no espelho retrovisor. Nosso predador promete a si mesmo caçar por aí, nas trevas da cidade outras vezes mais.   

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

DOLOSO =================

               Por causa                               Amei outras vezes
               Dessa sua maneira                Tantas quantas pude,
               Confusa de amar                    Entrega unilateral.
               Manual de teorias                  Desconfiava disso
               Postas em prática                  Quanto mais
               Foi que demos nisso.             Restou-me o vazio.

               Cobra de mim                         Você segue sentimentos
               A tua incapacidade.                Estabelecidos:
               Contradiz                                 Encenação apaixonada,
               Legítimas justificativas.           De início.
               Fazes bem o papel                  Calculista na despedida
               De vítima.                                 ...!?

                                   O amor é o tipo de coisa
                                   que só descobrimos a doçura
                                   e o amargo experimentando.
                                   Quem há de compreender
                                   esta escolha
                                   dada por "azar eletivo"?

                                   Devia naquela hora
                                   ter despertado a cidade,
                                   acusar-te de perjúrio...
                                   Feito sim, caso de polícia:
                                   - Venham ver como foge
                                   entre quatro paredes
                                   este amor bandido!

Pra quê... choraminguei a ocorrência.
Dos crimes do coração somos todos absolvidos.

BENDITO FRUTO ===========

Tanto que pediu ao Cristo na missa pela sorte do menino, livrar ele dos descaminhos do mundo traiçoeiro.
Antes Cleson vendia tapioca no centro da cidade a mando da mãe. Pra garantir algum mantimento pra casa. Tapioca dava pouco... Quis adiantar  o seu lado. Entrou pro tráfico. Vendia drogas.
- Sai dessa vida, Cleson! Isso dá cadeia!! - Insistiu. Ela não sabia onde tinha errado.
Outras vezes de combinação com os pariceiros, deu pra tomar o que é dos outros. Até entrava nas lojas do shopping torrando nota de $100. Querido pelas novinhas piriguetes da comunidade. Meteu algumas mais atrevidas em sua piroca de michos pentelhos. Botou banca na "quebrada".
Naquela tarde chegaram os policiais, sobem o morro. Arma em punho, é o seu cartão de visita... De olho na "fita", Cleson, ligeiro larga a lata de refrigerante. Mandou um assobio de alerta pros "trutas". Sacou do .38 enviesado na virilha... Foi coisa de filme. Trepou uma lajes. Desceu nos fundos duma birosca, nem pediu licença, saltou a mesa de sinuca espalhando o jogo... Ele já vazava a porta da frente.
Bem na subida pelo lance tortuoso da escadaria. Em direção dum beco estreito. Sua mira era míope ao alcance da certeira do "bota"... Perdeu no bang-bang.
Quis retornar, era tarde. Morreu sentado no batente do boteco, cabeça pensa no peito, a mãe ao seu lado conversa com ele como se ainda estivesse vivo.
- Você não ouve!... Desobedece o que a gente fala. Eu devia ter te dado uma surra, Cleson!... Por que fez isso comigo, filho!? Você disse que era só até juntar dinheiro. Acabou ficando sem nada... E ainda rouba meu juízo. Eu falei tira essa coisa da cabeça... Se matar por dinheiro!... - Gesticulava atarantada. Do alto, o helicóptero da reportagem flagra o fato.
Um tiro acertara bem em cheio o logotipo do seu "pano de grife".
- ...Eu falei pra ele não ir mais, gente... Olha o que aconteceu! - Murmura seu lamento. - Não foi isso que sonhei pra você. Não bastasse dar tudo errado pra mim, contigo foi pior, Cleson... Será castigo? Eu  que queria te ver homem formado. Até uma cadela velha feito eu merece ser feliz... - Queria abraçá-lo, não permitiam alterar a cena do crime. - Tu até podia não prestar, mas eles não tinham esse direito... Por que fui te botar no mundo? - Sangue escorre e suas lágrimas pingam em cima. Ele espuma coca-cola pela boca.