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terça-feira, 27 de dezembro de 2011

A VIDA NAS FÁBULAS ======

Outrora viviam numa árvore do meu jardim, sob à sombra das folhas tenras, um Caracol e uma Taturana. Confabulavam no entardecer bucólico, o céu rajado de matizes vermelhos, amarelos, lilases a borrar as nuvens estriadas.
- Tenho pensado em me mudar. - Dizia o molusco. - Não de casa, evidente... De lugar! - Fazia planos para iniciar nova dieta. A lagarta que não era muito de conversa, pois vivia com a boca cheia escutava meditabunda. - Pra mim, basta! Serei outrem!!... A horta aí do lado parece um ótimo recanto. Quiçá, lá eu encontre meu parceiro ideal. Aqui todos me olham esquisito! Não bastasse pichar Dona Cigarra, a linguaruda da Comadre Formiga deu pra se meter comigo. Ser hermafrodita não é assim, esse bicho de sete cabeças... É?
Eloquaz a Taturana engoliu a seco e desembuchou:
- Cada um veste-se com a roupa que possui.
- E comenta de você também. Um escândalo! Diz que quem te vê não te conhece... Bom, nem quero entrar em detalhes.
Na maioria das vezes tais intenções dele não passavam de queixumes, promessas vazias. Caseiro demais pra arriscar-se numa aventura até a horta vizinha. Quando avaliava as tragédias eminentes desistia. Deslizar incauto na crista de orvalhos agrotóxicos, as cáusticas lambidas do sol abrasador ou o apetite de uma corruíra faminta... Visões aterradoras do seu prematuro extermínio.
- Eu odeio esse canibalismo da natureza! Todos devíamos nos tornar vegetarianos. - Por conseguinte, aceitava o destino como lhe tinham escrito.
- Não é trancado em si mesmo que o universo vai abrir-te as portas. - Arguia a lagarta.

Dias depois ao procurar no galho a Taturana, o molusco deparou com aquele casulo tosco embalado pela brisa.
- Eu neste dilema existencial, e você resolve logo agora fazer um retiro espiritual...
Numa bela manhã de mesmices, o Caracol ouviu um frenético bater de asas e uma garoa de pólen aspergida pelo ar. Então, reparou que a lagarta dentro da pupa transformara-se naquela fabulosa borboleta.
    

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