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quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

ARQUIVO MORTO ===========

Uma vida inteira dedicada ao trabalho. Empregara-se como escriturária, entregue servilmente a rotina dignificante crente de cumprir o seu papel.
Todavia, nunca galgara maiores postos no setor público, apesar de diplomada em duas faculdades. Os melhores cargos sempre ficavam  praqueles outros envolvidos em arranjos partidários. Contudo, a língua não lhe obedecia contrariar, faltou-lhe o apadrinhamento político.
Agora, numa tardia constatação viu-se diminuída frente aqueles anos todos. O que era tornar-se uma ex. Ela não se distinguia alijada da conferência de documentos e arquivos.
Dona de uma figura pouco interessante, cujos méritos consistiam em destrinchar o trâmite burocrático. Era dada a fantasias românticas compensatórias. Nutria pelos colegas de repartição um amor ultra-secreto. Eles a rigor iam pra cama com todas as descompromissadas e algumas infiéis, exceto ela. O que fizera dela uma solteirona, menos por convicção do que contingência...
"Por que me deixei enganar? Só servi para favores... Nojentos! Depois desdenhavam de mim, sem me dirigir palavra. Malditos homens, seres cheios de fraquezas!" - Pegava-se dizendo para si mesma. Ensimesmada naquilo que acontecera. Estabelecidas frouxas relações de amizade, ninguém lhe era íntimo. Nenhuma parte dela havia no mundo... Quem usufruiria da apólice de seguro feita?
- Ganhaste a sorte de não fazer nada... - Insinuou o Diretor do Departamento certa inveja dissimulada, durante o aperto de mão ao parabenizá-la pela merecida aposentadoria.
Sua despedida se deu quase no anonimato, a não ser por três ou quatro assinaturas numas vias coloridas. Ela já não consta mais na lista de aniversariantes do mês. Era como se tivesse morrido. Ninguém lembraria dela.    

Um comentário:

Maria das Neves Marques de Araújo Silva disse...

Ah, meu amigo Urbain é único! Inteligente e sutil.Gosto das suas obras.

Abraços,

Neves.