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terça-feira, 20 de julho de 2010

O JULGAMENTO DE PIEDADE =====

" - O nenê vai ficar uma graça neste babador azul. Olha isso... Que meigo esse pagãozinho! - Se a patroa soubesse os tormentos que iam-lhe por dentro. - Fé, moça!! Deus só dá o fardo a quem pode sustentar... - Aquela criança parecia ser a única alegria desses seus 18 anos. Nunca teve amparo, rumo certo e morava agora no quartinho da casa em que era doméstica. A infelicidade anda acompanhada, dizem. O seu menino lindo tinha o corpinho entrevado de nascença. Que cruz aquela para um ser tão mirradinho! Jamais perseguiria atrás de uma bola de futebol. Ou correr até ela pedindo um abraço, pois os braços não obedeciam ao desejo do corpo. Que fosse enjeitada nenhuma novidade havia, contudo o filho merecia melhor sorte... Veio a noite. Tanta mágoa converteu-se em pranto abafado pela chuva. Suas súplicas pediam algum perdão. Mas apenas colheu do peito opresso respostas mudas, senão o fragor íntimo da tempestade... Quando o sol surgia e os pardais trilavam nas antenas correu a janela e deixou que a manhã entrasse, cobrindo o guri de luz. Vacilou tendo-o no colo entre os seios, ante aquele pensamento aterrador. Viu-se naqueles olhos miúdos... Debruçou-se sobre o recém-nascido, sufocando o rosto dele contra o travesseirinho e apoiou sua cabeça, soluçava desamparada..."
De repente, Piedade despertou com a voz do juiz. O promotor acabara de relatar as minúcias dos fatos. Que poderia alegar em sua defesa? Insistiu o magistrado percebendo seu aspecto contemplativo. De fato, no que regressava disse com aquela inocência do amor materno:
- Tive pena do meu garoto. Que vivesse preso numa cama. Dizem que quando as crianças morrem, viram anjos. Quem sabe no céu, com asinhas ele possa voar solto sem precisão das pernas...

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